CENA
V
NERISSA:
-
Querido! Que bom que chegou.
VALTER:
-
Aconteceu alguma coisa?
NERISSA:
-
A assistente esteve aqui...
VALTER:
-
Quem?
NERISSA:
-
A assistente daquele lugar que lhe comentei...
VALTER:
-
Lá vem você com essa história novamente.
NERISSA:
-
Valter...
VALTER:
-
Pensei ter deixado bem claro...
NERISSA:
-
Dá pra parar só um pouquinho e tentar me ouvi?
VALTER:
-
Esquece.
NERISSA:
-
Veja... é maravilhoso. Um lugar perfeito.
VALTER:
-
Já lhe disse que desta casa meu pai não sai.
NERISSA:
-
Ah... Já que é assim... então sai eu.
OBERON:
-
Não será preciso.
VALTER:
-
Pai?
OBERON:
-
Sua esposa tem razão. Estou incomodando... Já fiquei tempo demais. Não tem
cabimento continuar nesta casa entre vocês, abusando de sua hospedagem.
VALTER:
-
Que isso papai... Esta é sua casa.
OBERON:
-
Não. Esta é sua casa, da sua família.
VALTER:
-
Você faz parte desta família.
OBERON:
-
Meu filho... Seja prudente. Sou apenas um velho, já vivi muito, já vivi tudo
que tinha pra viver... e agora só me resta espera a morte.
VALTER:
-
Não diga bobagens. Ainda tem muito que viver. Não posso permitir que saia desta
casa.
OBERON:
-
Mesmo que esta seja minha vontade? Nerissa?
NERISSA:
-
Senhor?
OBERON:
-
Convide essa moça, a assistente social para conversar conosco.
VALTER:
-
Não. Negativo.
NERISSA:
-
Respeite a vontade do seu pai.
VALTER:
-
estou decepcionado com você.
NERISSA:
-
E eu com você.
OBERON:
-
Não quero que briguem por minha causa. Não desejo ser um estorvo na vida de
vocês. Chame a assistente social...
VALTER:
-
Não.
OBERON:
-
Filho, respeite meu desejo.
VALTER:
-
Mas papai?
OBERON:
-
Por favor. Seja razoável.
NERISSA:
-
Amanhã ligo e peço que venha aqui conversar conosco.
VALTER:
-
Não posso concordar com isso. É absurdo!
OBERON:
-
Filho, se me ama, faça o que tem que ser feito. (Sai)
VALTER:
-
Satisfeita?
NERISSA:
-
Quase. É fácil me criticar. Não é você que passa o dia em casa tendo que
suportar o incomodo e o transtorno de se ter um velho em casa.
VALTER:
-
Mas respeito. Velho não. Idoso. E você está falando do meu pai.
NERISSA:
-
Velho, idoso, tudo a mesma coisa. O incomodo é o mesmo.
VALTER:
-
Você não tem coração.
NERISSA:
-
Ainda bem. Se tivesse já teria enfartado. (Sai)
CENA
VI
(Entra
Oberon pensativo)
LISANDRA:
-
Vovô...
LEANDRO:
-
Oi vô?!
OBERON:
-
Meus queridos!
LISANDRA:
-
Tudo bem vovô?
OBERON:
-
Tudo na mais perfeita paz.
LISANDRA:
-
Estou lhe achando um tanto quanto pensativo.
OBERON:
-
Quando se chega a minha idade, as lembranças nos atormentam.
LEANDRO:
-
Então isso não é bom.
OBERON:
-
Depende... Quando é uma saudade que dói, machuca...
LISANDRA:
-
Saudades da vovó, né?
OBERON:
-
Não só. A juventude também me faz falta. Quando se é jovem, é bem mais fácil
recomeçar.
LISANDRA:
-
Mas não bom chegar a sua idade com tantas histórias...
OBERON:
-
Foi-se o tempo que cabelos brancos era sinal de sabedoria e respeito.
LEANDRO: -
Verdade. As pessoas já não respeitam mais os mais velhos.
OBERON:
-
Sou de uma época em que os idosos não precisavam de uma lei para serem
respeitados. Já se educava os jovens desde muito cedo a respeitar os mais
velhos.
LISANDRA:
-
Sempre gostei de ouvi-lo... Sempre nos contavam belas histórias, sabe vovô, ao
ouvi-lo contar sempre tive impressão que o senhor viveu todas, ali,
presenciando todos os fatos.
OBERON:
-
Sou de um tempo que nos reuníamos para ouvir... ouvir! Ouvir o que os outros
tinham pra nos contar. Mas hoje, as pessoas com essa vida louca, sempre
apressadas, não tem tempo nem mesmo pra ouvir os que estão ao seu lado.
LEANDRO:
-
É. Temos a impressão que o tempo passa tão depressa.
OBERON:
-
Os tempos são outros... Os valores também. Isto é, já não são mais importantes.
Estão todos tão focados no dinheiro, em se dar bem na vida, que atropelam a
todos e muitas vezes não enxergam as pessoas importantes que deixaram para
trás.
LISANDRA:
-
E quando se dar conta, tarde demais.
OBERON:
-
Exatamente.
LEANDRO:
-
Mas agora contamos com a tecnologia...
OBERON:
-
A tecnologia deveria ser um mecanismo para facilitar a vida e de certo modo
facilitou...
LEANDRO: - E
isso não é bom?
OBERON:
-
Não a parti do momento que pos uma barreira entre as pessoas.
LISANDRA:
-
Não entendi.
OBERON:
-
Quantos amigos você tem nas suas redes sociais?
LISANDRA:
-
Uns quinhentos...
OBERON:
-
E quantos você realmente conhece de verdade?
LISANDRA:
-
Como assim?
OBERON:
-
De ter uma relação próxima, de amizade, de sentar, bater um papo, contar
segredos, dividir alegrias, angustias, trocar confidencias...
LISANDRA:
-
Sei lá... Na rede, nenhum...
OBERON:
-
Então há uma ilusão no qual o numero de amigos que se tem na rede os torna
populares.
LEANDRO:
-
Entendi. Estamos tão conectados ao mundo virtual que passamos a desvalorizar o
mundo real.
OBERON:
-
Isso mesmo. Precisamos amar mais as pessoas.
NERISSA:
-
Há... Estão aqui.
LISANDRA:
-
Estamos.
NERISSA:
-
Vão lavar as mãos... Logo servirei o jantar. (Saem) Seu Oberon, amanhã a assistente social virá aqui.
OBERON:
-
Tudo bem. Será bem vinda.
LISANDRA:
-
E será. Assim como o senhor será bem, ido. (Sai)
OBERON:
-
Que Deus tenha misericórdia de você Nerissa! (Sai)
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