janeiro 31, 2013

LIÇÃO DE VIDA - TEATRO (ATO I CENA I E II)


LIÇÃO DE VIDA
De: Marcondys França
Personagens:
VALTER
NERISSA (Mulher de Valter)
LISANDRA (Filha)
LEANDRO (Filho)
OBERON (Pai de Valter)
ARIELE (Assistente Social)
PRIMEIRO ATO
CENA I
(Oberon esta sentado em uma poltrona, parece nostálgico)
VALTER: - Ainda acordado papai?
OBERON: - Sim... A insônia insiste em não me abandonar...
VALTER: - Precisamos averiguar isto. Suas insônias estão mais constantes.
OBERON: - Com o passar do tempo, o pesar da idade... As lembranças, a saudade, o pesar das horas nos atormentam.
VALTER: - Nostalgia...
OBERON: - Não. Apenas lembranças, de um tempo que não volta mais. O que nos restam, se não memorias, ou flashs de memorias, de tudo que foi vivido e ou que deixamos de viver acreditando que tínhamos todo tempo do mundo.
VALTER: - Ainda não acabou. Tem muito ainda que viver... Então pra que desperdiçar... O passado é importante, mais não deve deixar que seja muito mais importante que o presente.
OBERON: - Tem razão. Aproveitar o presente! Hoje entendo o futuro não existe, por que hoje passara a ser passado e amanha? Presente. Irônico não?
VALTER: - Então viva  papai... Viva intensamente cada segundo, cada minuto, cada hora, cada dia...
OBERON: - Não desperdiço, nem deixo de viver... No mais sou cercado de amor... Só que não dá pra deixar de recordar os momentos vividos...
VALTER: - Mamãe lhe faz muita falta, não é mesmo?
OBERON: - Sim, faz. Mas prefiro pensar que ela está bem, feliz... Que neste momento, ela está num lugar muito especial, tão especial quanto ela, sentada na relva verde, sentindo o vento acariciado sua face, contemplando a beleza de um lindo lago azul de águas transparentes... Sendo protegida pela sombra de uma árvore.
VALTER: - Oh, pai! Sempre achei que devias ser um poeta.
OBERON: - Não é poesia... É como imagino que seja o outro plano...
VALTER: - Não vamos mais falar disso... Eu estou aqui. Nós estamos aqui com o senhor.
OBERON: - O ruim de se viver muito... E presenciar a partida de todos que conhecemos e amamos...
VALTER: - Não diga isto. Queremos que viva bastante. Desejo que presencie meus filhos casarem, que segure em seu braços o seu bisneto...
OBERON: - Bisneto... Ah! Espero ter forças, não ser tão velho que não possa segurar...
VALTER: - O senhor é forte feito um touro! (Riem) Eu ajudo.
OBERON: - Sendo assim... Me sinto animado. Só espero que não demore muito.
VALTER: - Também não precisa ser pra tão logo, né?
OBERON: - Eu espero.
VALTER: - Mas falando sério... Me preocupa vê-lo assim, calado. Quietinho, num cantinho...
OBERON: - Diz o poeta: “E preciso que se aprenda a conviver com o silêncio, ele nos dirá em poucas palavras, tudo aquilo que precisamos ouvir”.
VALTER: - Pai... Quero que saiba, sempre estarei aqui.
OBERON: - Tem sua família. Não deve se importar com um velho...
VALTER: - Hei! Psiiii! Não diga isto. O senhor faz parte desta família.
OBERON: - Não quero ser um estorvo...
VALTER: - Não é. É meu pai, meu amigo de sempre, meu herói que sempre admirei.
OBERON: - Oh, filho! Sou o pai mais orgulhoso do mundo.
VALTER: - Se sou este homem, com estes valores, é por que segui seu exemplo, de honestidade e humanidade. (Se abraçam)
OBERON: - Meu querido filho.
VALTER: - Agora vamos... É tarde.
OBERON: - Claro. Vamos, filho.
VALTER: - E o senhor tente dormir. (Saem)
CENA II
NERISSA: - Precisamos conversar...
VALTER: - Bom dia Nerissa.
NERISSA: - Pra você o dia sempre está bom...
VALTER: - Não estou entendendo.
NERISSA: - Será? Ou finge que não entende?
VALTER: - Seja mais clara.
NERISSA: - Temos que dar uma solução...
VALTER: - Não estou entendendo...
NERISSA: - Não percebe que Lisandra já é uma moça, não dar mais para continuar no mesmo quarto que o irmão.
VALTER: - Que quer que eu faça?
NERISSA: - O que tem que ser feito.
VALTER: - Já conversamos sobre isto.
NERISSA: - Querido...
VALTER: - Não. Negativo...
NERISSA: - Valter...
VALTER: - Já disse que não. Não vou colocar meu pai num asilo.
NERISSA: - sabe que isso será inevitável.
VALTER: - Que esta dizendo?
NERISSA: - Seu pai vai precisar de cuidados...
VALTER: - Meu pai não é um objeto descartável.
NERISSA: - Não disse que era.
VALTER: - Mas age como se fosse. Como um objeto que depois de velho se descarta...
NERISSA: - Só acredito que seria viável...
VALTER: - o que?
NERISSA: - Calma. É que eu estive pesquisando... E encontrei um lugar...
VALTER: - Não. Nem começa.
NERISSA: - Por favor... Apenas me ouça. Olha, veja... (Dar um panfleto)
VALTER: - Um asilo.
NERISSA: - Não. Um lar... Olha bem... É diferente de tudo que já vimos.
VALTER: - nenhum lugar é melhor que o seio da família.
NERISSA: - Se quiser, podemos fazer uma visita. Conhecer...
VALTER: - Você esta louca.
NERISSA: - Solicitei a visita de um representante...
VALTER: - Não fez isso.
NERISSA: - Fiz.
VALTER: - É imperdoável.
NERISSA: - Acho bom você dar atenção. A situação aqui em casa esta ficando insustentável.
VALTER: - Realmente esta.
NERISSA: - Se continuar... Você terá que escolher.
VALTER: - Escolher?
NERISSA: - Sim. Escolher. Ou eu, ou ele. Os dois não dá.
OBERON: - Não será preciso.
VALTER: - Pai?
OBERON: - Sua mulher tem razão. Estou incomodando.
VALTER: - Nada disso.
OBERON: - Estou sendo demais.
VALTER: - Não está. É meu pai.
OBERON: - Não posso atrapalhar sua vida.
NERISSA: - Deu para escutar atrás da porta seu Oberon?
OBERON: - Sou velho, mais não sou surdo.
NERISSA: - Devia agradecer por todos esses anos...
VALTER: - Chega Nerissa!
NERISSA: - Chega mesmo. Estou no meu limite.  (Sai)
OBERON: - Ela tem razão.
VALTER: - Está louca.
OBERON: - Filho  já vivi o bastante... Não destrua sua família por causa de um velho.
VALTER: - Para. O senhor não é um velho... É meu pai.
OBERON: - E por ser seu pai, filho, te peço, ouça sua mulher.
VALTER: - Isso é loucura.
OBERON: - Acha que ficarei feliz aqui sabendo da insatisfação da sua mulher por causa da minha presença?
VALTER: - Oh, pai...
OBERON: - Por mim... Ouça o que ela tem a lhe dizer.
VALTER: - Mas pai...
OBERON: - Ficarei bem. Vá com ela conhecer este lugar. Pode ser bom.
VALTER: - Não posso fazer isso. Vai contra meus princípios.
OBERON: - Tem hora que temos que tomar certas decisões mesmo contra nossa vontade. Mas são decisões para o bem de todos. (Sai)
VALTER: - Droga! Que situação?! (Sai)

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